A notícia que vem de Cazenga é daquelas que fazem o mundo parar por um instante. Um filho, no alvorecer dos seus 20 anos, acusado de tirar a vida do próprio pai, já nos seus 74, e de ocultar o corpo no quintal da casa que compartilhavam. O suposto motivo, a ambição de tomar posse da residência, transforma um drama familiar em uma alegoria trágica sobre os nossos tempos.
Mais do que o sensacionalismo de um crime bárbaro, esta história deixa expostas feridas profundas. Fala de uma fractura tão extrema no núcleo familiar que o diálogo, o afeto ou mesmo o conflito aberto deram lugar ao cálculo mais frio e definitivo. O quintal, espaço simbólico de brincadeiras infantis, de reuniões familiares, de vida, torna-se uma cova. A casa, símbolo máximo de herança e abrigo, torna-se o prémio de um acto impensável.
A indignação da comunidade é natural e compreensível. É o choque colectivo perante a violação de um dos pilares mais básicos da humanidade: o respeito à vida dos nossos progenitores. No entanto, para além da justa demanda por justiça, esta tragédia obriga-nos a uma reflexão incómoda.
Que pressões sociais, que desespero por status ou posse, que falta de canais de diálogo podem levar a um abismo desses? Como é que o valor de um imóvel pode se sobrepor ao valor de uma vida, e ao vínculo que a originou? Esta história não é apenas sobre um jovem e seu pai; é um espelho distorcido, mas revelador, de uma sociedade onde o ter, por vezes, parece ofuscar brutalmente o ser.
Que a memória do senhor de 74 anos descanse em paz. Que a família encontre consolo, impossível que seja. E que, como sociedade, possamos olhar para este caso não apenas com horror, mas com a vontade de construir mais pontes, mais escuta, e mais humanidade, para que o pátio de uma casa nunca mais precise esconder um segredo tão terrível."
