Há histórias que custam a crer. Histórias que rasgam o tecido normal dos nossos dias e nos mostram um abismo de crueldade. Foi o que aconteceu em Lichinga, no Niassa, no passado dia 25 de Dezembro.
Enquanto o cheiro a comida natalícia se misturava com risos, noutra casa, o espírito da festa morria afogado em gritos e sangue. O que deveria ser um dia de reencontro familiar transformou-se no pior pesadelo de uma mulher. Vítima da pessoa que supostamente a devia proteger, ela foi submetida a um acto de barbárie extrema: o seu próprio marido atacou-a, mordendo-lhe e arrancando-lhe parte do nariz.
Os detalhes, divulgados pela TV Sucesso, pintam um cenário aterrador. A rotina doméstica de lavar a roupa interrompida por uma discussão que escalou para algo monstruoso. Num acesso de fúria que nega toda a humanidade, o agressor voltou-se contra o rosto da companheira, deixando uma marca permanente – física e psicológica.
Enquanto escrevo estas linhas, penso na vítima. Já não no “caso”, mas na pessoa. Ela está agora internada no Hospital Provincial de Lichinga, a suportar dores que vão muito além da carne dilacerada. A humilhação, o trauma, o medo, e a pergunta que nunca calará: “porquê?”.
E penso no agressor, na sua covardia. Não só a covardia do acto em si, mas a da fuga. Abandonou a mulher desfigurada e desapareceu, tentando escapar às consequências de ter destruído uma vida.
Às autoridades, exige-se celeridade. À sociedade, exige-se que não vire a cara. Este não é um “assunto de casal”. É um crime hediondo que mancha a nossa colectividade. O Natal em Lichinga ficou marcado por este grito de horror. Que ele, pelo menos, nos desperte para uma consciência colectiva mais firme contra a violência que se esconde atrás de portas fechadas.
A paz não é apenas a ausência de guerra nas ruas; é a segurança no próprio lar. E para uma mulher em Lichinga, essa paz foi-lhe roubada, literalmente, à dentada.
